Só há uma coisa pior no Mundo do que vítimas: as falsas vitimas. As falsas vitimas são aquela espécie de criaturas que se adaptam e vivem em todas os climas e mais alguns, sobrevivendo da pena alheia, que vão recolhendo e catalogando ao longo do tempo. Infelizmente, ou não, tive um tipo de educação que nunca me permitiu possuir paciência e compaixão por este tipo de pessoas, os ditos abutres sociais. Criaturas que se alimentam das fraquezas dos outros para prosperarem. Não quero com isto dizer que, não sei compreender e amparar as verdadeiras "vitimas". Todas as pessoas que me rodeiam carregam consigo um passado mais ou menos miserável, incluindo eu mesma. Todos temos falhas, todos cometemos erros, todos já sofremos numa proporção maior ou menor, dores que não devíamos ter sofrido. Certamente que aceito. Tudo bem, chama-se a isso a vida. A natureza e vida vivem de um equilíbrio necessário. Sem a chuva, o sol não tinha importância. Sem a dor não reconhecíamos a alegria. Vivemos numa linha de altos e baixos, de quedas e ascencões.
Assim sendo, é natural que aprecio pessoas que levam muito a sério aquele veredicto do " Entre o querer e o ter, só há a vontade !" E apesar de ser uma pessoa arrogantemente realista e friamente prática, acredito piedosamente nisto. Não somos o que temos, somos o que fazemos.. Ora, como a vida é uma encruzilhada de ironias, não poderia deixar de falar no meu caro colega de Blog, o Sr.João Matias. Escrevo senhor porque o respeito e a admiração que tenho por ele obrigam-me a fazê-lo. Então não é, que este rapaz, igual a tantos outros, nasceu com uma doença congénita, acarinhada pelo nome de spina bifída.. Podia ter nascido constipado, amuado, ou sem um dos mindinhos. (que sejamos francos; não servem para ABOSULUTAMENTE nada!) Mas não, tinha que trazer com ele uma doença que ainda por cima não é de forma alguma fácil de soletrar: s-p-i-n--a b-i-f-i-d-a. Que monstro, CREDO!!
Diz-se por aí, e tenho visto com estes olhinhos que a terra há-de comer, que o João a partir do momento em que foi escolhido por esta doença, foi também apadrinhado por um daqueles adjectivos tão portugueses que metem dó.Nada mais nada menos, do que aquela palavra tão vulgar e diária, como "coitadinho". Sim, o João foi ao registo civil e mudou o nome de João Matias para João Coitadinho Matias. Isto porque, não fazia sentido, ser apelidado pelo nome previsto, quando trazia consigo tantas dificuldades e entraves a uma vida "normal." (normal considerado aqui como socialmente agradável e aceite)
Bem, como a ironia e a vida, se cruzam tantas vezes, calhou que o João não se deixasse seduzir pelo seu novo nome . Aposto que foi preguiça ao escrever! É que pensando que não, de tanta vez que teve que escrever coitado ( na escolinha, em papéis burocráticos, na inscrição do cartão do continente,) cansou-se..
Até pela palavra chata e desnecessária que é.
O João é daquelas pessoas que eu gosto, que se cansam. Que vêem mais além. E o melhor de tudo.. Fazem por isso! O passado puxou-lhe as orelhas. Mas ele não o interpretou mal. Não se fez de falsa vitima. Não o transformou em amuleto do seu próprio azar. Nem num mau presságio do seu futuro. Potencializou-o. Desenhou uma rede de sonhos, e lutou por eles. Não sou ninguém. Ninguém é ninguém, para julgar a dor do outro. Mas e o sofrimento? Dores todos as temos. Algumas chegam até a serem insuportáveis. Mas o sofrimento é criado, e é criado pela única pessoa que o pode travar: nós mesmos. Daí a minha admiração por este rapaz. Não só venceu os seus próprios medos, as suas limitações, as suas inquietações e inseguranças, como derrubou o preconceito dos outros e provou a todos (nomeadamente a si mesmo) que tudo é possível quando a vontade é grandiosa o suficiente. O João frequentou um curso de desporto. É Booker e foi o primeiro Modelo em cadeira de rodas no nosso país. Partilha a sua história com o mundo sendo orador motivacional. É atleta de ténis em cadeira de rodas. Protagoniza o filme Born to fly. E o melhor de tudo o que já conquistou profissionalmente: é boa pessoa. Não se deixou arrastar por o lado negro que a vida às vezes tem. Fez da sua própria luz, a luz de muitos.
Porque não, pegar no exemplo do João, entre tantos outros lutadores, que diariamente escrevem a sua própria história? Porque é que não usamos as nossas próprias asas para na sétima queda, não termos que nos preparar para a 8º subida, mas sim para o 1º voo?
A nossa vida, o nosso destino, somos nós. E nós, com tudo o que temos (pouco, muito, tudo ou nada) somos abençoados com um par de asas.
Beijinho,
Lili


Excelente texto, como sempre.
ResponderEliminarSó uma pequena questão:
Liliana, acho-a parecida fisicamente com a Bernardina. Há algum grau de parentesco ou é apenas coincidência?
Com os melhores cumprimentos,
Cholo
É apenas uma infeliz coincidência. ;)
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