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quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Rascunho de amor


 Nestes últimos dias, tenho aproveitado este tempo choroso para ir relendo uns poemas da melhor poetisa portuguesa de sempre, a meu ver é claro. A Sra. Florbela Espanca. Neurose a mais, neurose a menos, creio que não há espaço nem tempo para discutir a genialidade da sua obra de uma força , tristeza e ambição intemporais, que muitos ainda não compreendem. Um dia destes prometo fazer uma publicação sobre a preciosa riqueza que deixou a este país!A deprimir umas vezes, e a meditar noutras, abriu-se-me o apetite para a escrita, e foi o que fiz, escrevi. Esta é uma carta de amor que nunca foi escrita. Nunca foi entregue. Mas que foi relida uma centena de vezes. É uma daquelas cartas que guardamos dentro de nós.


"Amor,
A incerteza não me deixa viver.
Não ostentas desamor por mim, e no entanto, a insuficiência do teu amor, comparece, sem nunca se atrasar. Desgasta o meu, sabes? Talvez tenhas uma guerra dentro de ti e o meu egoísmo não a compreenda. Talvez o teu olhar alucine que não deves nada ao mundo, que as guerras não te pertencem. Mas e eu? Eu estou aqui. Perdi três comboios, cinco sonhos, e um amor.
Por isso hoje, mas só hoje, peço-te: abandona-me de uma vez. Mostra-me de forma clara e rude, que não me amas. Descortina a névoa do que somos, deixa-me ver-te.
Hoje suplico-te: deixa-me de uma vez por todas. Sê mau. Vira as costas, grita, diz  que não presto, que não sei amar alguém que não eu. Diz que a minha beleza já não te alicia, que a minha alma à muito apodreceu. Diz que mereces melhor, que não te dou valor, que sou chata. Diz que a história que escrevi é ficção, e que não há amor que sobreviva a esta vida. Deixa-me triste, deixa-me só.
Perdi a inocência e nunca aprendi a recitar para mim mesma, um silêncio que a minha canção não compreende. Eu sei, já te pedi muito. Mas por favor, entende. O meu corpo é demasiado pequeno para o que tenho dentro do peito. Pelo menos lembra-te disso.
Hoje não peças desculpa, não uses clichés, não te justifiques, não te compares, não digas que mereço mais, que sou muito mais. Não me peças para domar uma dor que não sentes. Não digas que me conheces os cantos. Não me elogies com uma perfeição que não me pertence. Não prometas que vai ser diferente. Não jures que vai melhorar. Não me abraces, não me beijes, não me toques. Não me embales com esses gestos que tão facilmente me tomam a sensatez. Não te deites a meu lado triste. E por favor.. Não chores. As tuas lágrimas tornam tudo mais difícil , amor. Caiem como folhas, despem-te. E eu fico ali, pasmada a olhar para o teu rosto, encarando a inutilidade de um choro que nunca nos  levou a lado nenhum.
Hoje não, não me digas para ser paciente. Não me peças compreensão. Nem sequer discernimento.
Faz assim, olha-me nos olhos, aperta-me a mão e diz baixinho: acabou.
E o meu adeus vai ser leve. Leve como uma pena, mas sem pena de nada.
Vou apanhar um avião, vou dar mais a mão, vou sorrir sem noção.
Porque finalmente, o adeus é a certeza.
Tu sabes, sobrevivo na incerteza. Mas na certeza! Ai na certeza! Na certeza repouso em paz."





 Espero que tenham gostado!




Beijinho,
Lili






2 comentários:

  1. gostei muito desta "carta de despedida"
    um jeito para a escrita que deves de explorar ;)

    que muitos parágrafos passem por aqui,
    ML

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    Respostas
    1. Muito obrigada!.( E que muitos olhos leiam os parágrafos! Que sem os leitores, não passam de palavras organizadas.)

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