Para mim, a coisa mais fácil do mundo sempre foi distinguir instantaneamente uma pessoa especial de uma pessoa banal.
Nunca ninguém mo disse directamente, mas sei porque o sinto: distingo-as como a água
do azeite.
As pessoas especiais são aquelas que vemos no meio da multidão sem
que se pronunciem. Limitam-se a estar lá. São as pessoas a quem o
diálogo é prescindido, uma troca de olhares chega. As pessoas especiais, tenho
a sorte de conhecer algumas, não julgam, ajudam. Não reprovam, remendam. E
quando nos pedem uma mão, oferecem-nos imediatamente o resto do corpo. As tais
pessoas especiais de quem falo, não são excecionalmente bonitas, inteligentes
ou bem-sucedidas. No entanto, possuem um encanto quase mitológico: a qualidade,
hoje descurada, da tradicional autenticidade. Sem horas, folgas, nem modas,
vestem sempre o mesmo. Estas são as pessoas, que nos oferecem um sorriso jovem,
e momentos que não cabem em poemas. As mesmas que nos mimam numa constipação ou
numa ressaca, só para que no dia seguinte nos paguem mais uma rodada, e nos façam
sentir donos do universo. As pessoas especiais não se vão com o tempo nem com a
morte. Fazem-nos ser mais do que nós mesmos, em bem de algo maior, de algo
melhor. Algo que muitos já esqueceram a meio do percurso.
No entanto, não permitam por
lapso da ingenuidade, ou saudade, confundirem estas pessoas com aquelas que vou
tatuaram. Essas pessoas não são especiais, foram marcantes. Marcaram-nos no passado
e no passado sepultadas estão. Falo daquelas pessoas que um dia nos amarraram a
elas, não com cordas mas com palavras. Que nos fizeram rir , mas sobretudo que
fingiram acompanhar-nos na luta. Falo das pessoas que um dia foram nossas
confidentes, as que receberam os nossos gestos, e das quais hoje guardamos significativas e bonitas memórias. Enfim, a verdade é só uma: os momentos inesquecíveis que partilhámos não
são suficientes para lhes conceder o epíteto de “especial”. Até porque, de
entre todas as coisas que distinguem uma pessoa especial, da banal e da
marcante, a mais notória é o brilho que emanam.
Pessoas especiais esperam-nos no
fundo do túnel, e não desistem de abanar o braço, até que as alcancemos.
Escrevem-nos cartas, e-mails, fazem sinais de fumo se assim for necessário. Não
descriminam, não desistem. Desdobram-se em duas e descobrem como descortinar quem somos
quando ninguém está a ver: no sofá em frente à t.v, de pijama e descalços de pantufas e de fé. A
luz de que falo não nos cega, mas ilumina-nos, elucida-nos , até enxergarmos aquilo que quem ama
incondicionalmente vê.
Estas pessoas não são vulgares, são
vulcânicas. Aquecem-nos por dentro, e depois levam-nos para dançar. Sim, gosto de
pessoas especiais pela sua raridade, mas sobretudo porque me fascinam: a
humildade é escassa num mundo onde abundam abutres. E as pessoas especiais
acham-se tão pequenas… Mal sabendo elas o quanto são infinitas!
São poucas as pessoas
especiais que conheço, mas sem intrujice ou falsa ilusão , posso dizer de
coração cheio que sou uma sortuda por guardá-las tão bem, e sentir-me guardada.