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quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Pernas não vos quero!

Pernas para que te quero?!
Desde que me conheço, que as minhas pernas são minhas mãos. Confuso?! Talvez…para alguns! Para mim nunca foi, aprendi desde que nasci que as minhas mãos seriam mais do que simples mãos!!!
Hoje, as minhas mãos levam-me pelos caminhos surpreendentes do destino, caminhos alcatroados caminhos sobre terra batida!
Mãos que tocam nas rodas que me levam pela vida fora!
Mãos sofridas, mãos gloriosas! Mãos apaixonadas, mãos preciosas!
Lutar, suar, sangrar e até lágrimas! Mas nada me faz parar!
Mãos que me fazem ganhar tal como se pudesse voar! Não posso parar!
Caminho sobre rodas…sim numa cadeira de rodas! Acabou-se o tempo em que ficar paraplégico era o fim, para mim acabou desde que nasci!
Quando se está numa cadeira de rodas não é o fim do mundo, mas pode ser o início de uma nova visão do mundo.
A minha cadeira de rodas é um apêndice do meu corpo, não faz parte da minha personalidade.  A Cadeira acompanha na perfeição todos os movimentos do meu corpo, adaptou-se a mim e não eu a ela, é um complemento da minha força e não a minha fraqueza pois é ela que me leva onde eu não posso ir e porque não me conformo com o conformismo e portanto desde cedo, tomo decisões na minha vida que como outros diriam não lembram nem ao diabo, e por isso sou modelo, tirei curso de desporto entre outras mas mesmo assim sou deficiente motor. Irónico?! Contraditório?! Ou até impossível?!  Não penso assim, apenas faço o que quero e o que me dá prazer. Não é por andar numa cadeira de rodas que tenho de ter um padrão de comportamento que a sociedade reservou para os deficientes motores.
Ser feliz não é ter duas pernas, eu também as tenho se bem que não me servem para andar , mas e daí?! Tenho duas rodas que me levam onde tu também vais!  Ser feliz, sou eu, e gosto de mim como sou! E…”pernas para que te quero?! Se tenho asas para voar!”

terça-feira, 19 de novembro de 2013

SAUDADE


Tipicamente portuguesa , é a palavra que nos embala, que nos faz viajar, que nos traz o lamento. E não há remédio, sopa ou cigarro, que a tranquilize dentro de nós.
A saudade enrodilha-nos numa manta tricotada pelo tempo que vivemos, e que gozámos ontem, anteontem, à muito tempo. Já nem sei contá-lo... A saudade faz viver, faz reviver, faz noticiar, esperar. Cria expectativas que a realidade não permite superar. Cria  momentos singulares na nossa vida, soberanos aos verdadeiros acontecimentos. Faz arder o estômago, carrega consigo o traiçoeiro desejo de poder voltar. Rouba sorrisos imprecisos, de quem sente algo, que ninguém pode roubar. Perspectiva a natureza das coisas, valoriza o que foi perdido e transforma a sujidade em beleza. A verdade é que não há um só momento que supere a excelência de uma memória. 
A memória é uma raposa. Fugaz, traiçoeira. Chega pela noite, e quase sem se dar por ela, deixa-nos um rasto de pedaços do passado. Foge meticulosamente roubando-nos a razão que ainda nos sobra. Cria-se então, um ciclo infinito de ardores. Primeiro a dor, sólida e solene, pilar do que somos. De seguida, e muito rapidamente, chega a saudade. Arranha-nos por dentro, impossibilitando que a leveza da memória nos permita soltá-la. Da saudade à nostalgia vai o dedilhar de um fado. E quando se sente o ultimo acorde, o último suspiro, rebenta a melancolia. A robusta melhor amiga da incomensurável insatisfação. Chorar o perdido pode ser satisfatório para quem não urge possuir muito. Mas, para os vestidos de insatisfação crónica, quase inata, chorar as dores não é suficiente. Chora-se assim as possibilidades, os números, as paisagens e os sorrisos. Choram-se os abraços e os beijos, as despedidas e as mentiras que nunca chegaram a acontecer. Choram-se as promessas que nunca foram ditas, os sonhos que não chegaram a ser segredados. Chora-se a “ultima conversa”, que não houve, o “ultimo adeus” ,que não existiu.
Sim, quem um dia quis, sofreu.
A saudade e a tristeza são irmãs separadas à nascença.. Existe, irremediavelmente, um conjunto de cheiros, músicas, sorrisos, que nos fazem viver além tempo. Aquele espécie tão pessoal de humor, aquele afecto, aquela protecção, o particularismo de determinada forma de estar. A forma como cada pessoa nos cativa, prende e guarda não se perde. No entanto, troca-se a pessoa pela tristeza.
 Dentro do que somos, creio eu, existe um espaço enorme de saudade, criado para ser apreciado na posterioridade do instante. É engraçado como este espaço nunca está lotado. Existe sempre um espaço para mais uma memória, ou duas, ou três. Mas só Deus sabe o bem e o mal que nos faz espreitar aquele recanto de nós, deixando, só por mais uma vez, arder o fogo, que o tempo um dia roubou.




Despeço-me, com um dos sábios fragmentos da obra com que Pablo Neruda um dia nos brindou:
“Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos magoa,
é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe o que não existe mais...”


Beijinho,

Lili.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Asas para viver

Só há uma coisa pior no Mundo do que vítimas: as falsas vitimas. As falsas vitimas são aquela espécie de criaturas que se adaptam e vivem em todas os climas e mais alguns, sobrevivendo da pena alheia, que vão recolhendo e catalogando ao longo do tempo. Infelizmente, ou não, tive um tipo de educação que nunca me permitiu possuir  paciência e compaixão por este tipo de pessoas, os ditos abutres sociais. Criaturas que se alimentam das fraquezas dos outros para prosperarem. Não quero com isto dizer que, não sei compreender e amparar as verdadeiras "vitimas". Todas as pessoas que me rodeiam carregam consigo um passado mais ou menos miserável, incluindo eu mesma. Todos temos falhas, todos cometemos erros, todos já sofremos numa proporção maior ou menor, dores que não devíamos ter sofrido. Certamente que aceito.  Tudo bem, chama-se a isso a vida. A natureza e vida vivem de um equilíbrio necessário. Sem a chuva, o sol não tinha importância. Sem a dor não reconhecíamos a alegria. Vivemos numa linha de altos e baixos, de quedas e ascencões.
Assim sendo, é natural que aprecio pessoas que levam muito a sério aquele veredicto do "  Entre o querer e o ter, só há a vontade !"  E apesar de ser uma pessoa arrogantemente realista e friamente prática, acredito piedosamente nisto. Não somos o que temos, somos o que fazemos.. Ora, como a vida é uma encruzilhada de ironias, não poderia deixar de falar no meu caro colega de Blog, o Sr.João Matias. Escrevo senhor porque o respeito e a admiração que tenho por ele obrigam-me a fazê-lo. Então não é, que este rapaz, igual a tantos outros, nasceu com uma  doença congénita, acarinhada pelo nome de spina bifída.. Podia ter nascido constipado, amuado, ou sem um dos mindinhos. (que sejamos francos; não servem para ABOSULUTAMENTE nada!) Mas não, tinha que trazer com ele uma doença que ainda por cima não é de forma alguma fácil de soletrar: s-p-i-n--a  b-i-f-i-d-a. Que monstro, CREDO!!
Diz-se por aí, e tenho visto com estes olhinhos que a terra há-de comer, que o João a partir do momento em que foi escolhido por esta doença, foi também apadrinhado por um daqueles adjectivos tão portugueses que metem dó.Nada mais nada menos, do que aquela palavra tão vulgar e diária, como "coitadinho". Sim, o João foi ao registo civil e mudou o nome de João Matias para João Coitadinho Matias. Isto porque, não fazia sentido, ser apelidado pelo nome previsto, quando trazia consigo tantas dificuldades e entraves a uma vida "normal." (normal considerado aqui como socialmente agradável e aceite)
Bem, como a ironia e a vida, se cruzam tantas vezes, calhou que o João não se deixasse seduzir pelo seu novo nome . Aposto que foi preguiça ao escrever! É que pensando que não, de tanta vez  que teve que escrever coitado ( na escolinha, em papéis burocráticos, na inscrição do cartão do continente,)  cansou-se.. 
Até pela palavra chata e desnecessária que é.
O João é daquelas pessoas que eu gosto, que se cansam. Que vêem mais além. E o melhor de tudo.. Fazem por isso! O passado puxou-lhe as orelhas. Mas ele não o interpretou mal. Não se fez de falsa vitima. Não o transformou em amuleto do seu próprio azar. Nem num mau presságio do seu futuro. Potencializou-o. Desenhou uma rede de sonhos, e lutou por eles. Não sou ninguém. Ninguém é ninguém, para julgar a dor do outro. Mas e o sofrimento? Dores todos as temos. Algumas chegam até a serem insuportáveis. Mas o sofrimento é criado, e é criado pela única pessoa que o pode travar: nós mesmos. Daí a minha admiração por este rapaz. Não só venceu os seus próprios medos, as suas limitações, as suas inquietações e inseguranças, como derrubou o preconceito dos outros e provou a todos (nomeadamente a si mesmo) que tudo é possível quando a vontade é grandiosa o suficiente. O João frequentou um curso de desporto. É Booker e foi o primeiro Modelo em cadeira de rodas no nosso país. Partilha a sua história com o mundo sendo orador motivacional. É atleta de ténis em cadeira de rodas. Protagoniza o filme Born to fly. E o melhor de  tudo o que já conquistou profissionalmente: é boa pessoa. Não se deixou arrastar por o lado negro que a vida às vezes tem. Fez da sua própria luz, a luz de muitos.
Porque não, pegar no exemplo do João, entre tantos outros lutadores, que diariamente escrevem a sua própria história? Porque é que não usamos  as nossas próprias asas para na sétima queda, não termos que nos preparar para a 8º subida, mas sim para o 1º voo?
A nossa vida, o nosso destino, somos nós. E nós, com tudo o que temos (pouco, muito, tudo ou nada) somos abençoados com um par de asas. 



Beijinho,

Lili